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MLucia Montenegro

HIPÓTESE DE INCIDÊNCIA, FATO GERADOR E OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA: Mas afinal, o que é isso?



Há uma confusão entre hipótese de incidência e fato gerador, muito utilizados como sinônimos até mesmo no próprio CTN. Mas, a verdade é que são assuntos distintos e infelizmente, precisamos de uma análise mais técnica.


Imaginemos que eu olhe para o céu e veja nuvens pretas. Eu posso conjecturar e dizer: acho que vai chover. Bom, isso é uma hipótese apenas com base nas nuvens pretas no céu.


De repente, ouço um trovão e começa a chover realmente. Isso é um fato. Fato da vida.


Em direito tributário, podemos pensar à semelhança: a hipótese de incidência é a previsão legal da ocorrência de um determinado fato que, se ocorrer efetivamente, será suficiente para gerar uma obrigação tributária. Em resumo, podemos dizer que é a descrição hipotética de um fato.


Quando aquela hipótese se concretiza no mundo real temos a ocorrência do fato gerador do tributo. Este fato gerador também é chamado de fato imponível.


Então pensemos na lei do imposto de renda. A lei fala que “os rendimentos e ganhos de capital percebidos por pessoas físicas residentes ou domiciliadas no Brasil serão tributados pelo Imposto de Renda”.


Ora, a hipótese de incidência é a percepção de rendimentos e ganhos de capital, mas até alguém exteriorizar este ganho, continua sendo uma previsão hipotética. O fato gerador “renda” só vai aparecer quando efetivamente uma pessoa “receber renda”. Enquanto a pessoa não “receber renda”, não surgiu qualquer obrigação de pagar tributo, pois a hipótese de incidência continua no campo abstrato.


Existindo a hipótese de incidência e vindo a ocorrer o fato gerador, surge a obrigação tributária. Por raciocínio inverso, não há obrigação tributária sem uma previsão legal e um fato gerador.


Importante dizermos que a hipótese de incidência necessariamente deve estar prevista em lei, em sentido formal. Assim, não pode estar prevista em, por exemplo, em normativa da Receita Federal.


Isto porque, lembrem-se, que vive em nosso sistema jurídico tributário o princípio da legalidade estrita.


Também é importante falarmos que a hipótese de incidência deve ser antecedente ao fato gerador. Ou seja, mesmo que o fato x aconteça no mundo, ele somente será tributado se houver uma lei anterior à ocorrência do fato que diga que esse fato x é tributável. Também, prevê a lei uma consequência ao ocorrer o fato, que será a tributação. A esse fenômeno, de análise antecedente, de subsunção do fato à lei e a previsão de um consequente (que serão os efeitos), costumeiramente chamamos de regra-matriz de incidência tributária.


Antecedente normativo —> hipótese de incidência —> previsão do fato

Consequente normativo —> efeitos jurídicos —> tributação


O antecedente normativo da regra-matriz da hipótese de incidência, que é uma abstração, pode ser material, temporal e espacial.


Diz-se que o critério é material quando a hipótese é que discrimina o comportamento do sujeito passivo para que ocorra a tributação. Aqui define-se também a competência tributária.


O critério é temporal quando determina em que instante ocorre a hipótese descrita na norma, qual seja, o exato momento e, portanto, o momento em que surge a obrigação tributária e, por consequência, a legislação vigente aplicável no momento da ocorrência do fato.


O critério espacial, por sua vez determinará onde o fato gerador deve ocorrer para que incida a norma tributária.



Já o consequente normativo da Regra-matriz de incidência prescreve o dever subjetivo de pagar tributos decorrente da hipótese de incidência. Por dever subjetivo temos o 1) critério pessoal que é a identificação dos sujeitos da relação jurídico-tributaria, ou seja, o sujeito passivo, o devedor, de quem se exige a prestação; e também o sujeito ativo, o credor, aquele que exige a prestação, a obrigação principal e a acessória, e 2) critério quantitativo: informações determinadas na norma que delimitam com segurança o valor da imposição tributária, normalmente questões referentes á alíquota é base de cálculo.



Fato gerador


É no momento da ocorrência do fato gerador que surge a obrigação tributária. Esse mesmo momento determina a natureza jurídica do tributo, de acordo com o art. 4º do Código Tributário Nacional:


Art. 4º A natureza jurídica específica do tributo é determinada pelo fato gerador da respectiva obrigação, sendo irrelevantes para qualificá-la:

I - a denominação e demais características formais adotadas pela lei;

II - a destinação legal do produto da sua arrecadação.


Veja-se que não importa para a qualificação do tributo nem a sua denominação e nem destinação legal do produto de sua arrecadação.


EXCEÇÃO: Os empréstimos compulsórios e as contribuições não se definem pelo fato gerador, mas pela finalidade para a qual foram instituídos, de acordo com o art. 148 e 149 da Constituição Federal.


O fato gerador, por sua vez, deve ser necessário e suficiente para o surgimento da obrigação tributária. Sem a ocorrência não há obrigação, assim como a simples ocorrência já é suficiente para o surgimento da obrigação. É o que está previsto no art. 116 do CTN.


Aqui surge, também, relevância do debate acerca dos atos ilícitos gerarem tributos.


Diferentemente do que ocorre na esfera civilista, não importa a validade ou a licitude do ato para o fim de gerar tributação. Ou seja, mesmo o produto do ato ilícito, se estiver relacionado na hipótese de incidência gerará tributação. Porém, nunca a hipótese de incidência prevista em uma norma será um ato ilícito.


Em exemplo, podemos referir a venda do narcotráfico. Embora o narcotráfico seja uma atividade ilícita, o produto desta atividade ilícita - renda - por si só é apta a gerar a obrigação tributária de pagar o IR.


O serviço prestado em um meretrício poderia ser alvo da tributação pelo ISS, se assim eventualmente considerado um serviço.


Da mesma forma, uma construção irregular é geradora do IPTU.


Uma empresa que adquira ilegalmente uma mercadoria por importação irregular e, na sequência, a comercialize, essa operação estará sujeita ao pagamento de ICMS, Imposto de Importação, Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), PIS e Cofins, havendo ainda, impactos na apuração do IRPJ e CSLL.


Desta forma, vige o princípio da “pecunia non olet”, ou seja, o dinheiro não tem cheiro. Não importa a origem do ato que gera o tributo, se oriundo de ato lícito ou ilícito. Importa é o dever de pagar tributo.


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